Com prejuízos milionários à agricultura, pecuária e biodiversidade, o controle da população de javalis virou tema de disputa no Supremo
A batalha pelo controle dos javalis no Brasil acaba de ganhar um novo capítulo no Supremo Tribunal Federal (STF). A Corte analisa a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 7.808), movida pelo Fórum Nacional de Proteção e Defesa Animal, que contesta a Lei 18.817/2023 de Santa Catarina. Essa lei autoriza o abate de javalis como medida de manejo ambiental e agropecuário.
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A relatoria do caso está nas mãos do ministro Kassio Nunes Marques, e a decisão pode proibir de forma definitiva a caça da espécie em território nacional.
A espécie invasora, que inclui o javali-europeu (Sus scrofa) e os javaporcos (cruzamentos com suínos domésticos), já se espalhou por todos os estados brasileiros. Altamente adaptáveis, sem predadores naturais e muitas vezes introduzidos propositalmente para fins de caça esportiva, os javalis causam estragos severos: devastam lavouras de milho e soja, transmitem doenças ao rebanho, como peste suína clássica e febre aftosa, e ameaçam o equilíbrio ecológico ao competir com espécies nativas.
A Associação Brasileira de Caçadores “Aqui Tem Javali” estima que, diante da explosão populacional, será necessário abater mais de 1 milhão de animais em 2025. Em 2024, aproximadamente 500 mil foram abatidos, número que cresceu após restrições ao uso de armas de fogo dificultarem o controle. A associação denuncia a suspensão de licenças, atrasos nas autorizações de transporte de armas e o que chama de “boicote oficial” por parte dos ministérios do Meio Ambiente e da Agricultura.
Na ação, o Fórum de Proteção Animal alega que a lei catarinense é inconstitucional, pois apenas a União pode legislar sobre fauna e caça. A entidade ainda aponta que a norma abre caminho para caça desportiva, o que é proibido pela legislação federal vigente. Investigações sobre criadouros ilegais usados para fomentar a caça também foram mencionadas no processo.
O Ibama, por sua vez, reconhece os danos causados pelos javalis, mas se opõe ao abate em massa. O biólogo e agente ambiental Roberto Cabral afirma que não há dados técnicos para metas como a de um milhão de abates, já que o país não possui um censo oficial da espécie. Segundo ele, o método da caça armada, vigente desde 2013, fracassou em conter a praga e pode inclusive ter ampliado sua dispersão. O órgão defende novas estratégias baseadas em armadilhas, captura em grupo e monitoramento ambiental.
O STF enfrenta agora um impasse que coloca em xeque os rumos da política de manejo de espécies invasoras no Brasil: como garantir controle eficaz e rápido de uma praga que ameaça todo o setor agropecuário sem violar princípios legais e éticos da proteção animal? Enquanto a decisão não vem, produtores acumulam prejuízos e caçadores seguem à margem da legalidade.